Direito e Arquitetura por Guilherme Wisnik

O professor e arquiteto, Guilherme Wisnik, nos contou sobre as relações entre o campo do Direito e da Arquitetura.
Guilherme Wisnik é professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP). É Autor dos livros Lucio Costa (Cosac Naify, 2001), Caetano Veloso (Publifolha, 2005), Estado crítico: à deriva nas cidades (Publifolha, 2009) Dentro do nevoeiro: arquitetura, arte e tecnologia contemporâneas (Ubu Editora, 2018) e Bolívia 2016 (Circo de Ideias, 2018), e de Lançar Mundo nos Mundos: Caetano Veloso e o Brasil (2022) e é coautor de Espaço em obra: cidade, arte, arquitetura (Edições Sesc São Paulo, 2018). Recebeu o prêmio Destaque 2018 da ABCA (Associação Brasileira de Críticos de Arte) em maio de 2019.

O “Direito e o mundo” é um espaço dedicado a explorar as conexões existentes entre o campo jurídico e outras áreas do conhecimento. O professor Guilherme Wisnik nos contou a sobre a relação entre Direito e Arquitetura.

No dia 8 de março de 2023, a pesquisadora do Instituto Norberto Bobbio, Júlia Albergaria, se reuniu com o professor Guilherme Wisnik para debater as possíveis relações entre os dois campos do conhecimento.

Direito e arquitetura: o direito à cidade

INB: O direito à cidade é um direito humano e coletivo e por isso deve ser rigorosamente observado pelos governantes do país. Na sua opinião, de que forma o exercício da arquitetura e do urbanismo auxiliam na consolidação deste direito e na democratização do espaço público?

Guilherme: No âmbito da arquitetura e do urbanismo, quando falamos em direito à cidade é comum pensarmos em Henri Lefebvre e em David Harvey. Este teórico inglês retomou as ideias de Lefebvre e atualizou a sua discussão para a contemporaneidade. É importante destacar que Lefebvre compreende o direito à cidade não apenas como um conjunto de serviços – isso é importante porque ela não é um produto. A cidade é resultado, sobretudo, do exercício da cidadania. 

Essa chave de leitura retoma a interpretação grega acerca da pólis, enquanto espaço de exercício da política e cidadania. Nos tempos atuais, a tradução desse cenário implica compreender que a arquitetura como ciência, pode ser usada para ampliar o acesso democrático. A pretensão é de que a cidade seja um organismo usufruído pela maioria da população, de uma maneira razoavelmente igualitária. Evidentemente, tal ponto de vista é uma espécie de utopia pois, sob os parâmetros do capitalismo atual, as cidades são estruturalmente desiguais e violentas. Elas expulsam populações inteiras, na medida em que garantem acessos privilegiados há alguns. 

Contudo, o urbanismo como ciência se volta – ou, pelo menos, deveria se voltar – para a acepção da cidade como um bem comum. Isto é, com os mecanismos disponíveis, abre-se a possibilidade de criar e imaginar a cidade como uma comunidade de “comuns”. Eu utilizo o termo “comum” para não usar o termo “público”, já que ele é uma oposição do “privado”. Na verdade, essa palavra  está relacionada com a expressão inglesa “common” que possui um sentido de horizontalidade de diversidades. 

Um exemplo de instrumento para o exercício da igualdade na cidade é o Plano Diretor Estratégico. Este documento é elaborado pela prefeitura junto à Câmara dos Vereadores e nele estão contidas as principais ferramentas de legislação urbanísticas que regulam o funcionamento das cidades. Dentre elas, destaca-se a determinação das áreas de interesse social nas regiões centrais, um mecanismo que busca garantir uma certa democratização do uso das cidades. 

Se o governante relegar a terra ou deixar a valorização imobiliária simplesmente para o mercado, o que vai acontecer? Os locais que possuem melhor infraestrutura – onde há acesso à água limpa, ao esgoto, à luz elétrica, às redes wifi,  ao transporte público, às escolas e hospitais – se tornarão mais caros. Em contrapartida, as áreas menos favorecidas pela infraestrutura urbana serão não apenas barateadas, mas também  alvo de invasão. Inclusive, muitas delas são ocupadas de forma ilegal, como é o caso dos mananciais próximos às represas de São Paulo. 

Portanto, observa-se um uso da cidade completamente desigual, porque as populações mais pobres são sistematicamente expulsas das áreas mais valorizadas e têm de morar em locais muito distantes. Tais populações se deslocam em transporte público durante horas, todos os dias de manhã até o fim da tarde e isto cria verdadeiras anomalias urbanas. Por exemplo, os chamados “bairros dormitórios” são regiões sem nenhum serviço ou comércio: são desérticos ao longo do dia e de noite recebem trabalhadores para dormir.

Por essas razões é muito importante criar no Plano Diretor as áreas de interesse social nos centros de regiões mais valorizadas. Mas a eficácia desse processo necessita que o Estado forneça subsídios para as populações se deslocarem das periferias até os locais centrais. Nós sabemos que em São Paulo existem muitos imóveis vazios no centro e eles são fruto de uma lógica predatória, do crescimento imobiliário, etc. 

Essa é uma lógica própria do urbanismo norte-americano do pós-guerra. Em cidades como Los Angeles, onde o centro financeiro da cidade sempre busca novos territórios para gerar processos de valorização imobiliária, a consequência é deixar para trás regiões degradadas. E isso se relaciona ao uso do automóvel e às cidades de condomínios sub urbanizados. A lógica predatória resulta em áreas da cidade depreciadas, como foi o caso do centro histórico de São Paulo. Os proprietários preferem não vender os seus imóveis em baixa e por isso os deixam parados, esperando um processo de valorização. O resultado é um contingente robusto de imóveis vazios que perderam seus valores imobiliários.  

Tudo isso gera um custo enorme para a cidade, que teve inúmeros gastos com transporte público, água, luz, esgoto, etc. E esses imóveis que deveriam usufruir dasinfraestruturas, estão vazios. Por isso, um dos instrumentos mais recentes do Plano Diretor – embora ele já existisse no Estatuto da Cidade aprovado no início dos anos 2000 – é o IPTU progressivo. No Estatuto da Cidade, já existiam mecanismos para criar o IPTU progresivo que poderia ser aplicável na seguinte situação: se um imóvel está vazio, ele terá de pagar a cada ano um IPTU maior. Trata-se de um instrumento que incentiva a ocupação desses prédios. 

No caso da cidade de São Paulo, o último Plano Diretor elaborado na gestão de Fernando Haddad criou definitivamente o IPTU progressivo, uma ideia presente no Estatuto da Cidade. Sem entrar em juízos de valor, essa é uma forma de tentar fazer com que a lógica de mercado – que visa o lucro – seja atenuada por uma lógica de Estado preocupada com o bem comum. Portanto, as cidades exclusivistas devem ser melhor usufruídas democraticamente por mais pessoas.

Capitalismo, habitação e crises econômicas

INB: O direito à cidade é um direito humano e coletivo e por isso deve ser rigorosamente observado pelos governantes do país. Na sua opinião, de que forma o exercício da arquitetura e do urbanismo auxiliam na consolidação deste direito e na democratização do espaço público?

Gulherme: Antes, uma observação histórica. A crise da bolsa de Nova York de 1929 gerou uma bolha financeira que desregulamentou o mercado. Naquele momento, houveram reforços estatais, tais como as políticas do New Deal de Franklin Roosevelt, que representaram a volta do papel do Estado como provedor do bem estar social. Aliado a isso, temos as políticas populistas no Brasil de Getúlio Vargas, que criaram os sindicatos e por aí vai. Ao longo de algumas décadas, vivia-se sob a chamada era de ouro do capitalismo, assim como define Eric Hobsbawm. 

No início dos anos 1970 este processo é interrompido e marca o retorno de uma nova crise do capitalismo, conhecida como crise de superprodução. Com isso, há o retorno da lógica da financeirização e desregulamentação do mercado, que decolou o gap entre valor real e valor abstrato.  Até porque o capital financeiro investe em futuro, assim como a bolsa de mercadorias e futuros. Basicamente, vende-se futuros que ainda não existem e especula-se em cima deles. 

Além disso, os anos 1970 correspondem à crise do petróleo. Sabendo disso, o então presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, toma a decisão de lastrear o dólar do ouro. Desse modo, há a possibilidade da economia se tornar absolutamente autônoma, a economia financeira. No decorrer dos anos, a observação do gráfico de valor real e valor abstrato especulativo demonstra que cada vez mais, esses dois valores se separam e o valor abstrato especulativo financeiro é quem determina a economia. 

Este cenário gera muitos problemas. Dentre eles, as bolhas que estouram na relação entre mercado imobiliário, de terras, hipotecas e valorização financeira baseada num mercado que é irreal. Do ponto de vista da arquitetura e do urbanismo no Brasil, assistimos à uma forte entrada desse processo nos anos 1990, com as privatizações e a globalização. Naquele momento, foi possível observar mais concretamente a construção de prédios que não tinham mais um proprietário. Era como se fosse uma empresa que investe o seu capital na construção de sua sede, mas os proprietários são fundos de pensão, cujos títulos estão no mercado financeiro. O negócio é a construção de prédios, que são rapidamente alugados para as multinacionais. 

Essa paisagem do poder, tal como retratada por Sharon Zukin em seu livro Landscapes of Power, pode ser observada na Berrini, em São Paulo. De fato, ela corresponde a um tipo de paisagem genérica da cidade global, como define Saskia Sassen: são trechos da cidade que são iguais em qualquer lugar do mundo e que oferecem um tipo de edifício conhecido como “arquitetura inteligente”. Então, termos como “cidade inteligente”, “smart city”, “edifício inteligente”, se relacionam com o que o capital financeiro constrói e oferece para as empresas ao alugarem pisos dos edifícios. 

Trata-se de um cenário que altera muito a lógica. Antes, uma empresa que pretendia afirmar sua solidez, normalmente construía uma sede. E a arquitetura, que poderia ser simbolicamente monumental, pesada ou clássica, reiterava e demonstrava a força da companhia. No mundo financeiro, isso não é mais necessário, pois a empresa aluga andares de um prédio inteligente e na primeira crise econômica que acontecer, ela vai embora. Essa é uma vantagem: desalugar. As empresas atualmente possuem muito mais liquidez e fluidez. 

Entre o setor público e privado

Porém, qual é o problema disso? As parcerias público-privadas e operações urbanas são bancadas pelo Estado. Basicamente, os entes federativos realizam obras, constroem túneis e pontes, abrem avenidas, etc. E para isso, há um custo de infraestrutura urbana, pública e o serviço do capital privado. Assim, o poder público gasta muito para que esses lugares possam existir e funcionar. É por isso que, quando há sinais de crise econômica e as empresas deixam os prédios vazios, pode ocorrer uma grande quebra imobiliária. O poder público gasta muito para oferecer a infraestrutura e a contrapartida é muito pequena, porque as empresas podem alugar e ir embora em pouco tempo.

Nesse sentido, essas novas paisagens do poder são extremamente voláteis. Um grande arquiteto holândes chamado Rem Koolhaas trata do paradoxo: a arquitetura é a arte da solidez. Vitrúvio define os três princípios da arquitetura como firmitas (beleza), venustas (solidez) e utilitas (utilidade). Isso porque ela é a arte mais sólida de todas, ela literalmente constrói paredes. Essa solidez no mundo contemporâneo faz com que  apareça ser cada vez mais volátil e efêmera. Dessa forma, ela é tão efêmera quanto uma instalação de uma obra de arte. 

No meu livro “Dentro do nevoeiro” eu analiso obras arquitetônicas como o Blur Building, um edifício feito de fumaça para a Expo de 2002 na Suíça. A questão que se elabora ali é a volatilidade ou erosão da firmitas no mundo contemporâneo. E cada vez mais, a arquitetura pode ser algo que desaparece, como diz o título do livro de Marshall Berman Tudo que é sólido desmancha no ar. Esse título é uma definição da modernidade e é um trecho do Manifesto do Partido Comunista de Karl Marx e Friedrich Engels.

Brasília e o oásis arquitetônico

INB: A cidade de Brasília é mundialmente reconhecida como uma das mais importantes construções arquitetônicas da modernidade. Trata-se de uma cidade na qual se aloca o centro de poder político e jurídico do país. Como o senhor analisa o impacto de tais dinâmicas no projeto arquitetônico de Brasília ?

Guilherme: Entre 1956 e 1957, realizou-se o concurso do Plano Piloto no Brasil. Naquele contexto, todos faziam urbanismo e arquitetura moderna. O modernismo era uma unanimidade desde os anos 1950, embora a monumentalidade não fosse um consenso. Realizar um projeto que afirmava essa ideia sobre a capital era algo importante; afinal, ela é o centro do poder civil do Estado brasileiro.

 Mas também concorriam os projetos não monumentais. Seus adeptos defendiam que Brasília fosse pequenas comunidades autossuficientes, baseadas no modelo inglês de Cidade-Jardim. Uma curiosidade é que Lúcio Costa foi o ganhador do concurso Plano Piloto e não Oscar Niemeyer. A posição dele era que Brasília tinha que ser urbs e civitas simultaneamente. Urbs é um termo em latim que significa cidade cotidiana ou cidade da vida cotidiana. Já civitas é a cidade da vida pública do Estado com sua expressão monumental inserida na arquitetura simbólica do Niemeyer.

Aliás, essa foi uma discussão do júri. O australiano William Halford, que foi membro principal do júri, destacou a qualidade do projeto Lúcio Costa. Ele achava que a capital tinha que ter uma expressão monumental. Esta é uma opinião compartilhada por Mário Pedrosa, pois ele escreveu defendendo a monumentalidade contra os Irmãos Roberto, que fizeram o projeto Cidade-Jardim.

Quando Brasília foi inaugurada, muitas pessoas comemoraram. O então Ministro da Cultura da França, André Malraux, chamou a cidade de “capital da esperança”. De certa forma, Brasília era a realização do sonho moderno que nasceu no começo do século. A arquitetura de Niemeyer, sempre foi muito inteligente porque criou as logomarcas: as colunas do Palácio da Alvorada, por exemplo, são copiadas com frequência em casas, parachoques de caminhão, etc. Elas viraram um símbolo, uma imagem e um vernáculo modelo. 

Eu particularmente acho que isso foi importante. Brasília é uma capital e tem que construir uma imagem diferente das cidades comuns. Tanto é que no dia 8 de janeiro de 2023, vimos os reacionários depredarem a Praça dos Três Poderes. Eles tiveram de atacar o patrimônio público e esses símbolos criados pela arquitetura e urbanismo. Durante muito tempo, ninguém sabia o papel do Judiciário e do Legislativo em um país presidencialista, mas com tudo o que aconteceu nos últimos tempos, está clara a relevância dos três poderes. E a Praça simboliza essa articulação que nada mais é do que os pilares da democracia representados na arquitetura. 

O fato de serem construções transparentes, de vidro e com acesso por rampas é um aspecto interessante. Isto é, não há escadas e elevadores, de modo que o público não fica muito separado dos lugares. A rampa é um passeio contínuo, é como se andássemos pela cidade: você continua como se não houvesse barreiras. Portanto, a casa política é a casa do povo brasileiro. 

Após o ataque de 8 de janeiro, saíram inúmeros artigos sobre o assunto. Um deles defendia a construção de muros e blindar os palácios como bankers. O diagnóstico era que o problema devia-se à falta de segurança, porque eram muito vulneráveis e as arquiteturas eram abertas. Mas não foram feitas como bunkers. Essa arquitetura monumental é ao mesmo tempo muito pedestre e por isso mesmo é moderna. A monumentalidade stricto sensu era típica do período clássico que vai até o século XIX, quando a arquitetura passa a ser definida como sede de poder inviolável. Aquelas colunas gregas e  frontões reiteram essa ideia, como podemos ver na Casa Branca, em Washington.

A monumentalidade pode dar a impressão de uma separação muito forte. Mas a Praça dos Três Poderes e a Esplanada dos Ministérios foram pensadas como um lugar da multidão, uma manifestação por excelência da diversidade. Se há inúmeras opiniões divergentes, elas podem encontrar na Esplanada dos Ministérios um lugar de expressão das diferenças. E o que vimos no Brasil, nos últimos anos, foi a declaração da intolerância política. Em 2016, durante a votação do impeachment da Dilma no Congresso, um muro de madeira provisório foi construído na Esplanada dos Ministérios para separar os dois lados, já que eles não podiam conviver um com o outro. 

Então, isso foi uma espécie de golpe de morte na simbologia do urbanismo moderno brasileiro feito em Brasília. Essa cidade pensava o espaço público como o lugar do encontro das diferenças e naquele momento já não havia lugar para isso. O segundo momento dessa intolerância foi a própria invasão dos palácios e a destruição deles por um dos lados dessa história.

Direito e arquitetura: trabalho e deslocamento

INB: Na atualidade, a proliferação e desenvolvimento das novas tecnologias transformam sistematicamente as relações de trabalho. Nesse sentido, uma parte dos trabalhadores não precisam sair de suas casas para trabalhar, o que altera a dinâmica de uso do espaço público. Quais são os impactos desse processo nos espaços de uso coletivo?

Guilherme: O professor Roberto Schwarz escreveu um texto chamado “ As ideias fora do lugar” no qual analisa Machado de Assis. Nesse texto, ele mostra como no Brasil – um país colonial escravocrata –  os valores liberais iluministas são sempre uma espécie de teatro. Na verdade, são conceitos importados que chegaram no país no século XIX  e se tornaram uma farsa. 

De certa forma, eu acho que a ideia de espaço público ou esfera pública é, do ponto de vista brasileiro, algo fora de lugar. Trata-se de um valor liberal, burguês, iluminista e europeu que encontra uma sociedade na qual essas questões não podem se realizar. A sociedade não criou o valor do público no sentido de uma comunidade de iguais. Portanto, na dimensão da esfera pública, o reconhecimento é o que nos une. 

Ao contrário, o “público” é visto pela maior parte da população brasileira como o lugar da corrupção, do inimigo e não de pertencimento. Então, depreda-se o público ao invés de cuidar. Eu diria que o dia 8 de janeiro  de 2023 foi uma espécie de caricatura desse processo.

O espaço público sempre foi uma espécie de mal entendido entre nós. Em São Paulo, os parques e as praças são gradeados, privatizados e destruídos pela passagem de avenidas. E a sociedade brasileira se desenvolveu modernamente no século XX, sem reconhecer o espaço e a esfera pública nesse lugar da coletividade. Mas algo diferente acontece nos últimos anos, a partir do início do novo século. 

É possível observar vários movimentos de defesa e batalha pelo espaço público. Iniciativas como o Parque Augusta, o Parque Minhocão, o Parque do Bixiga, o Teatro Oficina e a Paulista Aberta em São Paulo fazem parte de uma nova etapa dessa história. Um outro exemplo é o movimento Ocupe Estelita no Recife, que luta contra a especulação imobiliária que pretende transformar o Cais José Estelita do Porto em um grande condomínio. Há também o movimento Praia da Estação em Belo Horizonte que promove o uso da Praça da Estação de uma maneira libertária. Todas essas ações são movimentos de batalha pelo espaço público e manifestam um tipo de sentimento de apreço que antes não existia no Brasil.

Durante esses tempos,  penso o que aconteceu para isso mudar. Eu acho que se trata de uma combinação de fatores. Os movimentos de ocupação que começaram com Wall Street em 2011, as primaveras, etc. Em São Paulo, a existência da Parada Gay, da Virada Cultural e do carnaval de rua criaram um clima para que as pessoas percebessem a importância do espaço público. Isso despertou uma vontade de frequentar a cidade, mas a pandemia da COVID-19 veio contra esse vetor. De certa maneira, tudo isso vinha amadurecendo e de repente o vírus nos levou ao isolamento, o que ocasionou uma verdadeira demonização do contato com o outro. Este foi um grande azar histórico, considerando que estávamos em um movimento progressivo de desejo pelo espaço público. E agora, a gente está nessa encruzilhada e temos de avaliar como as coisas serão retomadas.

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